Política de Dividendos

Resenha

Finanças
Dividendos
Autor

Kléber Formiga Miranda

Data de Publicação

18 de agosto de 2022

A política de dividendos trata da forma como a empresa distribui seu lucro aos acionistas. O tema se demonstra simples pelo fato de tratar de uma expectativa natural de qualquer investidor, qual seja a geração de fluxo de caixa por meio de retornos de seus investimentos. Os dividendos constituem o rendimento direto da aplicação de recursos na participação acionária das empresas. Entretanto, diversos aspectos permeiam esse tema a ponto de surgirem vertentes diferentes para definições das políticas de dividendos das empresas. Nessa resenha serão discutidos os resultados de pesquisas elaboradas por Brav, Graham, Harvey e Michaely (2004) relacionados à política de dividendos, Heineberg e Procianoy (2003) quanto aos aspectos determinantes do pagamento de proventos em dinheiro, Procianoy e Verdi (2003) tratando do efeito clientela e, por último, Procianoy e Vieira (n.d.) tratando das reações do mercado de capitais aos dividendos.

O estudo de Brav et. Al (2004) tratou de realizar um survey com executivos financeiros à luz da pesquisa de Lintner, nos anos 50. A proposta de Brav et. Al (2004) foi determinar fatores que direcionam as decisões de pagamento de dividendos ou recompra de ações. Foram realizadas diversas perguntas com gestores contemporâneos (o artigo cita século XXI), sobre questões relacionadas ás motivações para pagamentos de dividendos e utilização de questões de agência e sinalização. Nos executivos das 28 empresas pesquisadas por Lintner, 50 anos antes, as evidências mostram maior propensão de pagamento de dividendos por empresas maduras e geradoras de lucros persistentes no longo prazo. Nas evidências e Brav et. Al (2004) já se observa a pretensão pela flexibilidade da recompra de ações.

O contraponto de Brav et. Al (2004) com os achados de Lintner se deu em duas vertentes, quais sejam o conservadorismo e a decisão com base no índice de payout. Os executivos contemporâneos, diferente de seus pares dos anos 50, demonstraram menor conservadorismo e distanciamento das decisões com base no payout. As decisões de investimento na empresa passaram determinar as decisões. Os aumentos de dividendos passaram a ser considerados após supridas as necessidades de investimentos e liquidez. De acordo com as entrevistas realizadas verificou-se a propensão dos gestores em aceitar redução na recompra de ação em relação a redução de dividendos – menor conservadorismo. Apenas 22% dos respondentes acreditam no efeito negativo da recompra de ações e 90% dos respondentes atribuem um fato negativo ao se reduzir dividendos. Outro percentual revelador da evidência dos dividendos é 40% dos respondentes declararem ter como alvo o dividendo por ação.

Por meio de uma regressão linear considerando os dividendos defasados e lucros correntes para explicar os dividendos atuais, Brav et. Al (2004) compararam os resultados dos respondentes com uma amostra de não-respondentes retiradas do Compustat. Os resultados confirmaram o fato de o prêmio de dividendos não ser mais tão importante quanto na época de Lintner. Uma discussão realizada na pesquisa é o fato de haver relação entre o lucro do período o fato de haver ou não meta de dividendos. Os resultados sugeriram haver respostas no sentido de não objetivar dividendos quando as metas não são alcançadas. Ao mesmo tempo, empresas sem objetivo de dividendos possuem baixo crescimento dos lucros, altos índices de endividamento e pagam poucos dividendos.

As implicações para decisões de dividendos ou recompra de ações se deve a fatores como tributos, clientela, conflitos de agência e sinalização. Sob o ponto de vista dos tributos, Brav et. Al (2004) identificam a sua influência nas decisões de payout. Quanto a clientela, observam não haver preferência por dividendos pelos investidores institucionais. Diversos respondentes discordam que dividendos atraiam esses investidores. Entretanto, os dividendos são vistos como redutores de conflitos de agência mais eficazes relação a recompra de ações. O fato de ter a política de pagamento de dividendos, segundo respondentes, aumenta o monitoramento das atividades da gestão. Quanto a sinalização, permaneceu a lacuna de como o mercado absorve a informação quanto ao pagamento de dividendos ou recompra de ações. Inicialmente Brav et. Al (2004) esperavam a existência de associação entre dividendos e recompra de ações com a informação.

No mercado brasileiro, os determinantes para política de dividendos foram analisados por Heineberg e Procianoy (2003) com empresas listadas na então Bovespa no período de 1994 a 2000. Um ponto importante nessa pesquisa é o trato do termo dividendos para proventos. A pesquisa abrange não apenas dividendos, mas os juros sobre capital próprio – uma particularidade do mercado brasileiro. Nesse cenário o efeito tributário se torna mais evidente dada a possibilidade de escolha pela distribuição de lucros ou pagamento de juros sobre capital próprio. O Brasil é um ambiente propício para análises dessa natureza, pois ao longo dos períodos anteriores à pesquisa, os fatores relacionados a política de dividendos oscilaram bastante (Heineberg & Procianoy, 2003).

Os resultados de Heineberg e Procianoy (2003) foram analisados por meio de dados em painel com variáveis voltadas a captar efeitos na política de proventos (variável dependente). Além dos lucros/prejuízos, já recorrentes na literatura desde Lintner em 1956, foram analisados a estabilidade da política com o passar dos anos, a tributação, inflação, endividamento, crescimento/investimento, tamanho e setor da empresa. Cada variável possui implicação na política de pagamento de proventos como é o caso do endividamento que, por gerar despesas dedutíveis, interfere no resultado e no desempenho do gestor. Oportunidades de crescimento, por sua vez, exigem maior retenção de recursos e, consequentemente, menor distribuição de proventos.

Os autores (Heineberg & Procianoy, 2003) experimentaram segmentar os resultados por setor e por quintis de payout. Os resultados dessa segmentação revelaram haver diferenças nas informações utilizadas por cada setor ao definir a sua política de dividendos. Os payouts, por outro lado, demonstraram-se iguais com divergência marginal em poder explicativo entre os quintis. De um modo geral, observou-se que no mercado brasileiro há uma política consistente de pagamento no sentido de dar previsibilidade de fluxo de caixa para os acionistas interessados em proventos (Heineberg & Procianoy, 2003). Associa-se a possibilidade de a empresa sinalizar ao mercado por meio da emissão desvantajosa (sob o aspecto tributário) de dividendos. Emitir dividendos, mesmo sob efeito da tributação, indicaria uma expectativa futura positiva.

Por outro lado, Procianoy e Verdi (2003) avaliam o efeito clientela no qual investidores sujeitos a altos impostos sobre dividendos passam a se interessar em adquirir ações, mesmo com baixos rendimentos. Sob uma baixa alíquota o interesse seria o interesse se concentraria em ações com altos rendimentos. Esse efeito é indicado por Miller e Modigliani em seu estudo de 1961. Os proventos analisados no período de pesquisa (1989 a 1993) foram marcados por uma divergência importante, qual seja a tributação apenas no ganho de capital (juros sobre capital próprio) e isenção dos dividendos.

A proposta da pesquisa é avaliar o comportamento dos retornos após o anúncio dos dividendos. Para tal, avaliou o comportamento das ações pagadoras de dividendos com base no modelo de Elton e Gruber (variação do preço da ação no primeiro dia de negociação do título sem direito ao dividendo anunciado) e verificaram a existência de retornos anormais num período de 11 dias em torno da data em que as ações foram negociadas com direito a receber dividendo. A definição do retorno anormal se deu por comparação (subtração) do retorno média da empresa e do portfólio de mercado (IBOVESPA) calculados no período da janela do evento (Procianoy & Verdi, 2003).

Considerando a isenção dos dividendos e uma tributação de 0% ou 25% para os juros sobre o capital próprio, o intervalo esperado para o preço da ação deveria se situar entre o preço anterior deduzidos dos proventos e o preço anterior deduzido dos proventos sob influência tributária (proventos / (1–0,25)). O estudo foi realizado com ações pagadoras de pelos menos um dividendo, negociadas na então BOVESPA no período de 1989 a 1993. O alvo inicial de 1569 distribuições de dividendos resultou na amostra de 693 eventos analisados (132 empresas), dada a falta de negociações nos períodos cumdividend e ex-dividend (Procianoy & Verdi, 2003).

Os resultados apresentados em Procianoy e Verdi (2003) contrariam a literatura por não apresentar efeito anormal do anúncio de dividendo nos preços das ações. Apenas 5% dos 693 casos analisados apresentaram o preço dentro do intervalo teórico determinado pela pesquisa. Verificou-se que 47% dos eventos apresentaram um resultado surpreendente na medida em que o preço da ação no primeiro dia ex-dividend foi maior do que na data em que a ação tinha direito de receber dividendos. Isso propõe um comportamento irracional, pois não faria sentido pagar um valor maior por uma ação após exercido o direito de receber os dividendos. A preocupação de como os dividendos interferem no mercado de ações com retornos anormais constituiu preocupação em texto de Procianoy e Vieira (n.d.), sendo o último a ser discutido nessa resenha.

Nesse texto, Procianoy e Vieira (n.d.) demonstram haver evidências empíricas no mercado americano de que stock dividends (bonificação com ações) estão associados a retornos anormais no dia da execução. Contudo, não haveria razão lógica para tal relação, pois a bonificação de acionistas com ações na mesma proporção das já possuídas não altera a composição acionária, nem política de investimentos e financiamentos. A alteração da bonificação causa efeito apenas no aumento do valor do patrimônio líquido das empresas por meio de aumento de reservas. As stock dividends são tidas na literatura como uma decisão cosmética, dada a sua evidente falta de efeito nas empresas.

Todavia, essa não é a evidência encontrada por Procianoy e Vieira (n.d.). Seus resultados, obtidos por meio de estudo de evento com empresas de capital aberto negociadas no Brasil, Argentina, Chile, Colômbia e México com realização de stock dividends no período de janeiro de 1987 a maio de 1997. Considerando evento a data da realização da assembleia deliberativa sobre a realização da bonificação, utilizou-se uma janela de 61 dias, sendo 30 dias úteis anteriores e 30 dias úteis posteriores ao evento, mais a data do próprio evento que foi excluído o cálculo dos retornos. Os resultados sugerem a ocorrência de insider trading, pois há a sugestão de antecipação das decisões de investidores aos resultados devida a vazamento de informações ou pela crença de aprovação corriqueira das propostas de bonificação. Com base nos resultados foi possível conjecturar que a informação, embora disponível, foi negligenciada por investidores menos atentos, abrindo espaço para investidores qualificados obterem retornos anormais.


Brav, A., Graham, J. R., Harvey, C. R., & Michaely, R. (2004, june). Payout policy in the 21st century. Working Paper, 14, 1-42.

Heineberg, R. & Procianoy, J. L. (2003, setembro). Aspectos determinantes do pagamento de proventos em dinheiro das empresas com ações negociadas na Bovespa. Anais do Encontro da ANPAD, Atibaia, SP, Brasil, 27.

Procianoy, J. L. & Verdi, R. (2003). O efeito clientela no mercado brasileiro: será que os investidores são irracionais? Revista Brasileira de Finanças, *(2), 1-23.

Procianoy, J. L. & Vieira, K. (n.d.). Capital market reaction to stock dividends: event study in latin America.


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