Modelos de Precificação de Ativos

Resenha

Finanças
CAPM
Autor

Kléber Formiga Miranda

Data de Publicação

19 de julho de 2020

A discussão acerca do modelo de precificação de ativos, com os trabalhos individuais de Sharpe, Lintner e Black (1964-1972), direcionou-se pelo tratamento da média-variância das carteiras de mercado proposta por Markowitz, em 1959. Entretanto a predição central de profissionais e acadêmicos giravam em torno do beta (β) de mercado, sob a justificativa de ser uma função linear positiva dos retornos esperados (a inclinação da regressão gerada pelo retorno de uma ação em relação ao de mercado) e de ser suficiente para descrever a cross-section de retornos esperados. Nessa resenha serão abordados os aspectos propostos por (Carhart, 1997; Fama & French, 1992, 1993, 2004) quanto a fragilidade do beta de mercado, isoladamente, prever retornos futuros. Especificamente, serão demonstrados outros fatores discutidos nessa literatura capazes de melhorar a previsão de retornos e avaliar os custos para obter previsões mais precisas.

A pesquisa de Fama e French (1992) se inicia discutindo as contradições do modelo de Sharpe, Lintner e Black (SLB) para os quais o beta captaria todos os efeitos da média dos retornos das ações. Entretanto, a pesquisa de Banz, em 1991, é citada em Fama e French (1992) por revelar essa relação com o tamanho (ME – Market Equity: Patrimônio Líquido a valor de mercado calculado pela multiplicação do preço das ações outstanding e o número dessas ações), pois empresas maiores possuem um menores médias de retornos em relação às menores. Outra contradição é demonstrada nos achados de Bhandari, em 1988, quanto a relação positiva entre a alavancagem e os retornos médios. Para Fama e French (1992), essa associação é aceitável, todavia, no modelo SLB o risco oriundo da alavancagem é capturado pelo beta de mercado. Dessa forma, além do tamanho e do beta, Bhandari evidencia a contribuição da alavancagem em explicar a série de retornos médios das ações.

Adicionalmente, Fama e French (1992) abordam o fato de o book-to-market equity (razão entre o valor contábil das ações ordinárias das firmas e o seu valor de mercado) também ser um fator explicativo do retorno médio das ações, baseados nos trabalhos de Stattman, de 1980, e o de Rosenberg, Reid e Lanstein, de 1985 cujos resultados indicam uma relação positiva entre ambos, corroborados pelas evidências empíricas de Chan, Hamao e Lakonishok também foram abordadas, as quais revelam essa relação no mercado japonês. E, por fim, um quarto fator é apresentado, qual seja a razão entre lucro e preço baseados nos achados individuais de Basu e Ball em suas pesquisas de 1983 e 1978, respectivamente. De acordo com esses achados, quando os preços são mais baixos que os lucros, tornando o índice lucro/preço mais alto, os retornos e o risco das ações também são mais altos.

Ressaltou-se o fato dessas variáveis, em especial a razão lucro/preço, o tamanho (valor de mercado das ações em circulação), endividamento e o índice market-to-book serem escalonadas pelo preço. Esse fato corrobora para uma possível redundância na descrição dos retornos médios das firmas. Ainda assim, Fama e French (1992) objetiva avaliar o papel conjunto de todas essas variáveis na explicação dos retornos médios das ações listadas nas bolsas AMEX, NYSE e NASDAQ. Para o cumprimento desse objetivo a pesquisa, em atenção ao fato da proximidade das variáveis explicativas, a correlação entre todas elas foram avaliadas como forma de evitar atribuição de explicação do retorno médio das ações com variáveis similares. Contudo, na avaliação de Fama e French (1992) as correlações entre as variáveis e o beta, por vezes se demonstraram altamente correlacionadas, como no caso dos portfólios criados com base no tamanho. Embora não discutam na pesquisa, ressalta-se a formação do tamanho e do retorno ser realizada por meio do preço, essencialmente.

Dos achados de Fama e French (1992) destaca-se a confirmação da fragilidade do beta como variável explicativa do retorno médio das ações. Os autores, no entanto, buscam motivações para essa fragilidade na correlação entre as variáveis explicativas e sua “obscura” relação com os retornos médios. Porém, essa iniciativa não teve sucesso, dada a falta de poder explicativo do beta quando os autores analisaram a relação dos retornos médios com o beta sozinho. O resultado principal de Fama e French (1992) é o fato de apenas o tamanho e o book-to-market equity serem capazes de explicar o retorno médio das ações no período analisado.

Dessa perspectiva, Fama e French (1993) partem de seus achados de 1992 e ampliam os testes do modelo de precificação de ativos em três vertentes. A primeira tratou de aumentar o conjunto de retornos de ativos a serem explicados, incluindo, além das ações, os títulos corporativos e governamentais, pois apenas as ações ordinárias foram consideradas no estudo de 1992. Na segunda vertente, ampliaram as variáveis para atender os resultados oriundos da análise de títulos com o objetivo de examinar se as variáveis importantes para a análise do retorno dos títulos ajudam a explicar os retornos das ações e vice-versa. Partiu-se do pressuposto da integração do mercado entre títulos e ações. O método de análise consistiu na terceira vertente (destacada como mais importante) explorada em Fama e French (1993). Tratou de usar regressões de séries temporais ao invés de regressão cross-section. Dessa forma, retornos mensais e títulos são regredidos com o retorno de um portfólio e simulando portfólio por tamanho, book-to-market equity e fatores de risco nas estruturas dos termos.

Foram construídos seis portfólios com a interseção de dois grupos do fator tamanho e três grupos do fator book-to-market. As análises foram realizadas, portanto, considerando os grupos: S/L, S/M, S/H, B/L, B/M e B/H. O S e B correspondem ao porte pequeno (Small) ou grande (Big) e as letras L, M e H correspondem, respectivamente, aos onde grupos de baixo book-to-maket equity (Low), médio (Medium) e alto (High). Considerando a análise por quintis foi possível analisar 25 portfólios. Essas divisões por grupos e por quintis permitiu visualizar concentrações de até 74% do valor total pelas maiores empresas. Essa informação é relevante nas análises e para os achados da pesquisa.

Os fatores analisados foram cinco: Prêmio de risco (Rm – Rf), tamanho (SMB – Small minus Big), book-to-market (HML – High minus Low), diferença entre retorno mensal dos títulos de longo prazo do governo e taxa do tesouro do mês anterior (TERM) e a diferença entre a o retorno de um portfólio de mercado de títulos de longo prazo e o retorno mensal dos títulos de longo prazo do governo. Usados sozinhos, fatores de títulos de mercado capturam variações comuns no retorno das ações assim como nos retornos de títulos. De forma similar, fatores de mercado capturam variações compartilhadas nos retornos de títulos tão bem quanto o faz com os títulos de dívida. Essa verificação foi importante, pois a relação entre ações e títulos de dívida teve sua fundamentação obscurecida até então.

Os achados baseados nas regressões de séries temporais demonstrou-se interessante, segundo Fama e French (1993), considerada a similaridade entre as cross-sections utilizadas no estudo de 1992 e as regressões de séries temporais quando identificam o tamanho e o book-to-market equity como os fatores capazes de explicar os retornos médios das ações (R – Rf). Entretanto, a maior diferença entre os retornos médios das ações e a taxa livre de risco (Rf – one-month bill rate) não são explicadas por esses fatores sozinhos. Para essa finalidade destacou-se o fator mercado. Assim, o prêmio de risco para o fator mercado alinha o retorno médio das ações e as dívidas quando produzem inclinação na reta da regressão composta por tamanho e book-to-market.

De um modo geral os cinco fatores utilizados em Fama e French (1993) estão relacionados. Utilizando os portfolios com base em tamanho e book-to-market foi possível avaliarem a associação por meio da covariância entre ações de mesmo grupo. Os três fatores de mercado de ações se demonstraram amplamente não correlacionados com qualquer outro dos dois fatores de estrutura dos termos relacionados aos títulos, permitindo um bom resumo da separação dos papeis desses cincos fatores na volatilidade dos retornos e na cross-section dos retornos médios.

Para Fama de French (1993) a escolha de fatores sem uma teoria subjacente se torna arbitrária. A escolha de fatores, especialmente o tamanho e o book-to-market é motivada pela experiência empírica, sendo os demais fatores detalhados na pesquisa sob diversas formas para tornar sugestivas as associações com versões particulares dos fatores, contudo não definitivas. Com base nessas associações é possível, segundo Fama e French (1993), selecionar portfólios, avaliar a performance de portfólios, medir retorno anormal em estudos de eventos e estimar o custo de capital, a depender da capacidade dos cinco fatores evidenciarem uma boa descrição dos retornos médios. Então, a habilidade de gestores em identificar fatores capazes de prever retornos seria uma boa estratégia frente aos demais investidores no mercado.

A persistência do bom desempenho nos investimento de fundos mútuos foi estudada por Carhart (1997) em horizontes curtos de até três anos, buscando responder as motivações para desempenhos persistentes não documentados na literatura. Na sua análise incorpora o fator momento (momentum) ao perceber, com base na literatura, o consumo de ganhos pelos custos de transação. Demonstra-se que as despesas têm, no mínimo, um impacto negativo na performance, chegando a aproximadamente 0,95 por cento do valor de mercado das negociações. Nessa perspectiva, mantendo as taxas de despesas constantes, os fundos podem perder rendimentos na base de 80 pontos por ano.

Para as análises da pesquisa Carhart (1997) utilizou a seleção de portfólios por decis da qual identificou se a persistência nos retornos dos fundos mútuos se deviam a heterogeneidade nas características médias dos fundos por decil com base em estatísticas descritivas. Mesmo identificando algumas divergências entre os decis (portfólios) Carhart (1997) evidencia a principal motivação para os resultados positivos e persistentes dos fundos mútuos por meio dos custos de transação. As evidências não constituem má precificação (mispricing), pois os altos alfas (valores não explicados pelos fatores de Fama e French) dos fundos eram relativos às despesas do período. Depreende-se, dessa forma, a consistência com a eficiência de mercado quando não há ganhos excessivos por parte dos fundos. O alto rendimento é contrabalanceado com altos custos de transação, tornando os ganhos, em média, compatível com os demais participantes de mercado.

Portanto, para investimento em fundos, Carhart (1997) lança mão de três importantes regras quais sejam: i) evitar fundos com desempenho baixo persistente; ii) as expectativas de retornos são acima da média em anos posteriores a retornos altos; iii) custos de transação e de carga no fundo possuem impacto direto na sua performance. Com essas regras é possível não endeusar a gestão dos fundos pela sua performance, pois os altos rendimentos possuem relação positiva com o aumento dos custos.

As proposições de (Carhart, 1997; Fama & French, 1992, 1993) demonstram a importância da teoria da precificação inauguradas por Sharpe e Lintner na década de 60. Porém, passados diversos anos e discussões variadas não há consistência na sua utilização para definição dos retornos futuros. Fama e French (2004) realizam uma revisão da literatura envolta no CAPM – Capital Asset Pricing Model e concluem pela sua fragilidade para medir a risco e a relação com o retorno e risco esperado. Para os autores, infelizmente as aplicações do CAPM são frágeis possivelmente por falhas teóricas em consequência da simplificação de muitos pressupostos. A pesquisa de Fama e French de 1992 marca o ponto quando o CAPM passa a ter seus problemas fatais potencialmente reconhecidos. (Fama & French, 2004).

Dentre os defensores da fatalidade das falhas do CAPM predominam os comportamentalistas (behavioristas – behavioralists), cuja visão baseia-se na evidência de que a relação market-to-book não consegue estabelecer uma diferenciação clara de valor para a empresa quando está em crescimento ou em dificuldades. A outra frente de crítica ao CAPM trata das premissas irreais tratadas no modelo, indicando a necessidade de um modelo mais complexo capaz de realmente precificar os ativos. Na prática, não é fácil determinar se o problema é no modelo ou de má precificação, pois o preço sempre pode ser expresso como o valor presente dos fluxos de caixa. Então, se duas ações de mesmo preço possuírem fluxos de caixa diferentes, a de maior fluxo de caixa esperado terá o maior retorno esperado (Fama & French, 2004).

Outros aspectos de crítica são apontados por Fama e French (2004), dos quais se destaca a adoção das proxies para a carteira de mercado. Os autores citam Roll (1974) quando argumenta jamais ter ocorrido teste empírico do CAPM dada a falta de uma carteira de mercado real. Para Fama e French é possível que proxies sejam utilizadas para a carteira de mercado, porém a sua utilização pode ser refutada quando utilizam o mercado americano como benchmark em relações não aplicáveis, levando a rejeição dos testes empíricos. A má utilização dessas proxies leva a estimativas errôneas de retorno esperado nas aplicações, como por exemplo as estimativas de custo de capital baixas para ações pequenas com alto book-to-market.

Por fim, Fama e French (2004) destacam que a versão do CAPM desenvolvida por Sharpe e Lintner nunca teve sucesso, sendo melhor aceita na versão de Black. Após a década de 70 outras variáveis foram incorporadas ao modelo, tendo em vista a fragilidade explícita do beta em prever retornos médios, cujas evidências poderiam ser espúrias. Assim, os problemas do CAPM são tão evidentes e tão graves a pontos de invalidar a maioria das suas aplicações.


Carhart, M. M. (1997). On persistence in mutual fund performance. The Journal of Finance, 52(1), 57–82.

Fama, E. F., & French, K. R. (1992). The cross-section of expected stock returns. The Journal of Finance, 47(2), 427–465.

Fama, E. F., & French, K. R. (1993). Common risk factors in the returns on stocks and bonds. Journal of Financial Economics, 33, 3–56.

Fama, E. F., & French, K. R. (2004). The capital asset pricing model: theory and evidence. Journal of Economic Perspectives, 18(3), 25–46.


De volta ao topo