Governança Corporativa: Sinalização

Resenha

Finanças
Governança
Autor

Kléber Formiga Miranda

Data de Publicação

13 de fevereiro de 2021

As empresas sinalizam a sua adoção de práticas de governança corporativa para atrair investidores na expectativa de obter ganhos econômicos. Contudo, o resultado econômico, uma medida da eficiência da gestão, pode não ser o único interesse das partes interessadas na firma. Investidores e governos podem ter outras preocupações, como a diligência, boa-fé, honestidade, transparência e prestação de contas dos detentores do poder. Dessa forma, é viável criar expectativas positivas quando o poder corporativo é exercido por conselheiros, diretores, acionistas dominantes, e em algumas situações as partes interessadas, tais como sindicatos, banqueiros, grandes fornecedores e / ou clientes.

Turnbull (2010) define a boa governança, em termos práticos, como a capacidade de as empresas atingirem eficazmente o seu propósito, minimizando os envolvimentos legais ou regulatórios, protegendo e promovendo os interesses das partes interessadas na empresa e da sociedade em geral. Torna-se uma forma de enriquecer a governança da sociedade, permitindo às partes interessadas obterem as informações, vontade e poder para proteger e promover seus interesses. Trata da participação de um sistema político, cuja finalidade é definir como o poder é distribuído e exercido na sociedade.

A Governança Corporativa é o conjunto de processos imbuídos em garantir uma remuneração justa ao investimento. Para tal, foca no problema de agência para o qual surge quando os proprietários delegam o controle da companhia a outrem, propiciando interesses adversos entre o proprietário e seu contratado. As regras corporativas para mitigar esses problemas fornecem uma estrutura de organização para facilitar a relação entre os agentes, onde os gestores são incentivados a agir em consonância com o interesse dos acionistas. Alguns desses instrumentos são conselho de administração, reuniões de acionistas e de votação e remuneração de executivos. (Bhagat, Bolton, & Romano, 2010).

O país onde a governança corporativa é implementada também influencia na sua eficácia ou melhor utilização. Para Denis (2010), alguns fatores influenciam a diferença sistemática entre países tais como o sistema legal, o grau de proteção do investidor, questões cultuais e sociais. Os sistemas de governança dos países, tanto afetam como são afetados por níveis de desenvolvimento econômico e financeiro de cada país, além de seus graus de investimento e níveis de globalização.

De fato, a adoção de práticas de governança é interessante e, ao mesmo tempo, controversa. Alguns procedimentos simples, em teoria, são de difícil aplicabilidade por esbarrar no comportamento humano e na tradição empresarial do lucro pelo lucro. Portanto, serão discutidas possíveis falhas nessas práticas, seja de ordem teórica ou prática. A incerteza quanto a relação direta entre a governança corporativa e o desempenho das empresas também será abordada nesse position paper e, por fim, apresentados as potenciais linhas de pesquisas sobre governança a serem realizadas.

A gestão empresarial é norteada pelos objetivos traçados pelas empresas em prol de sua continuidade. Além do lucro, as empresas se prestam a atender demandas de outros usuários como clientes, fornecedores, governo, etc., como forma de se destacar das demais e gerar valor ao acionista. A estratégia empresarial deve reconhecer e atender esse emaranhado de interesses além da expectativa legal, afinal de contas a continuidade da empresa depende desses parceiros. Essa atitude é definida por Turnbull (2010) como “boa governança”.

Assim, a definição de boa governança pode ser a eficácia das empresas em atingir seus propósitos, minimizando o envolvimento legal e promovendo o interesse de todas as partes interessadas, inclusive a sociedade em geral. A boa governança corporativa torna-se uma forma de enriquecer a governança da sociedade, permitindo acesso às informações necessárias a tomada de decisão de todos e distribuindo o poder de forma equânime para atendimento igualitário de direitos.

A separação entre o proprietário e gestor promoveu a necessidade de monitoramento de ações no intuito de avaliar o alinhamento de interesses entre ambos. Eventualmente (ou humanamente natural), o gestor iria satisfazer sua utilidade em detrimento dos objetivos empresariais. Ao transacionar no mercado a empresa incorre, portanto em custos denominados de custos de transação.

O desenvolvimento sustentável das empresas precisa de uma explicação sobre o a existência da empresa e como criar uma estrutura sustentavelmente eficaz. Na teoria dos custos de transação de Williamson, esses custos são socialmente desenvolvidos, mas difíceis de identificar e medir sem antes lançar suposições sobre as relativas contribuições desses nos custos fixos e variáveis. A prática de governança, para ser viável, deve propor custos de monitoramento suficientemente baixos para não prejudicar o resultado da empresa.

A adoção das melhores práticas sugere haver melhoria nos resultados das empresas, contudo, essa relação não é confirmada empiricamente e as práticas adotadas podem ser utilizadas para sinalizar algo positivo ao mercado, mas sem praticá-las efetivamente. Turnbull (2010) alerta para o fato de muitos fundos de investimento tomarem decisões por diversos investidores de fato. Os interesses dessas entidades de investimento podem conflitar com os interesses dos investidores pessoais e da sociedade.

Constitui-se, no contexto apontado por Turnbull (2010) um ambiente suscetível a falhas interesses mais amplos são colocados em pauta. A realidade dos poderosos permaneceria inalterada. Até mesmo a independência da auditoria pode ser questionada, pois a presidência da comissão de auditoria, geralmente alcançada por executivos diretos, pode ter interesses privados, mas não os assume. As regras impostas podem não alcançar todas as facetas utilizadas para utilização de meios escusos aos interesses das empresas.

A preferência seria a punição da gestão quando houvesse falhas na condução das estratégias definidas, observado o ambiente da empresa, pois não há como aplicar melhores práticas em ambientes falhos. Momentos de crise, entretanto, contribuem para reflexão de melhorias futuras nas práticas de governança. (Turnbull, 2010).

As dificuldades apresentadas por Turnbull (2010) parecem lógicas, mas a ocorrências de crises decorrentes de falta de informações válidas retoma a necessidade de normas cada vez mais eficazes no combate aos conflitos nas relações contratuais. O desempenho da firma deve ser revelado com a clareza e objetividade. Todas as nuances envolvendo os resultados presente e futuro das empresas devem ser divulgados, reduzindo as chances de falhas nos processos de escolhas de investimentos.

De acordo com Bhagat et al. (2010), apesar da crença generalizada na importância dos mecanismos de governança para a resolução de problemas de agência, a literatura empírica sobre o efeito dos mecanismos de governança corporativa no desempenho das empresas não identificou efeitos positivos. Tem havido inúmeros estudos examinando o impacto da composição do conselho no desempenho. Da mesma forma, a maioria dos estudos interessados em medir o impacto da ação ativa dos acionistas no desempenho também não encontram relação. Diversas outras proxies são utilizadas para tentar chegar a uma relação entre governança e desempenho, mas não foram exitosas. A exceção está nos estudos interessados na relação entre direitos de voto e desempenho. Nessas pesquisas foram encontradas relações significantes e positivas entre as variáveis.

O desafio das pesquisas sobre governança é o fato de a assimetria de informações entre os agentes acontecer em nível da firma. Mensurar o comportamento gerencial ou a habilidade de quem conduz a gestão da empresa não constitui tarefa fácil e relacionar essa variável com o desempenho apoia negativamente esse cenário. Tanto as ações de governança quanto o desempenho são endógenos. Além do mais, o desempenho relatado pelas empresas não é decorrente das ações gerenciais do mesmo período. Dificilmente acontecerão concomitantemente, indicando haver outro obstáculo na relação governança-desempenho qual seja o momento da causalidade entre ambos.

Esses percalços metodológicos evidenciam, todavia, a dificuldade de se relacionar empiricamente essas duas variáveis. Do ponto de vista teórico é bastante razoável relacioná-las, afinal espera-se da parte contratante menos favorecida de informação sempre um sinal positivo quando se demonstra transparência e responsabilidade na relação.

Então, quais são os mecanismos protetores do retorno adequado aos acionistas, considerando a possibilidade de sua expropriação pelos controladores dos ativos da corporação? Esse questionamento, levantado por Denis (2010) reflete a expectativa da relação entre atitudes de governança e o desempenho das empresas.

Para Denis (2010), a primeira geração de pesquisas sobre governança corporativa inclui mecanismos internos, como o conselho de administração, os planos de remuneração de executivos e a estrutura de propriedade como resposta ao questionamento. Já a segunda geração inclui o sistema jurídico dos países, o grau de proteção legal do investidor, além de fatores culturais e sociais.

A pesquisa internacional sobre governança corporativa, até o presente momento, fornece muita informação sobre o porquê e como as empresas empregam vários mecanismos de governança e a sua eficácia nos sistemas conhecidos pela empresa. Para Denis (2010) duas questões surgem: qual o direcionamento futuro da governança corporativa e onde deve ser comandado? A adoção de regras comuns para mercados diferentes para não ser a forma mais viável de regulação.

A emergência da governança corporativa deveu-se a fatores comportais inerentes ao homem. A busca pela maximização da utilidade do indivíduo permanece sendo o maior entrave para se entender a viabilidade de se implementar normas de governança nas empresas. Normalmente são dispendiosas e requerem um esforço conjunto para serem implementadas. Na ausência de maximização de utilidade, se esperariam empresas imbuídas em atender todas as exigências da outra parte relacionada e com interesse na firma – um comportamento inverso ao observado pelos meios acadêmico e profissional.

O caráter endógeno e subjetivo da governança dificulta a realização de pesquisas preocupadas na sua relação com o desempenho das firmas. Os resultados negativos para sua grande maioria podem decorrer da mensuração das variáveis por meio de proxies. Medir comportamentos, atitudes e efeitos de regras não são em nada fácil de executar. Assim, toda a teoria fundamentadora da governança corporativa fica prejudicada, considerando os resultados empíricos ainda não a confirmarem.

Portanto possíveis erros teóricos da governança ainda estão por serem refutados objetivamente. A regulação em torno desse tema deve progredir em níveis mais específicos. O comportamento de empresas, empresários e gestores em economias diversas podem diferir e a “receita” para reduzir o conflito de agência em determinado mercado pode não servir para outro. Os reguladores devem ficar atentos a todas as nuances comportamentais antes de emitir normas ou regulamentos e a academia deve permanecer na busca de determinantes para o desempenho da firma e, quem sabe, a governança possa ser um deles.


Turnbull, C. S. S. (2010). What’s wrong with corporate governance best practices?. In H. K. Baker & R. Anderson (Eds.). Corporate governance: a synthesis of theory, research, and practice (Chap. 5, pp. 79-96). New Jersey: Wiley.

Bhagat, S., Bolton, B., & Romano, R. (2010). The effect of corporate governance on performance. In H. K. Baker & R. Anderson (Eds.). Corporate governance: a synthesis of theory, research, and practice (Chap. 6, pp. 97-122). New Jersey: Wiley.

Denis, D. K. (2010). International corporate governance research. In H. K. Baker & R. Anderson (Eds.). Corporate governance: a synthesis of theory, research, and practice (Chap. 7, pp. 123-140). New Jersey: Wiley.


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