Evidenciação Contábil
Resenha
A contabilidade se estabelece na economia como um instrumento de redução de assimetrias por meio da elaboração e emissão de informações empresarias no intuito de suprir agentes de mercado com informações úteis para suas tomadas de decisão. Na relação contratual da firma as decisões são voltadas a permanência nos contratos assumidos entre os agentes. A contabilidade ao mensurar e divulgar o resultado de cada agente, sofre influência das partes contratantes em nível compatível com sua participação no contrato.
É imprescindível a utilidade da informação contábil nesse contexto, pois, conforme Paulo (2007), além de medir o desempenho da gestão, serve de monitoramento de contratos, ampliando seu interesse pelos diversos agentes possíveis da empresa. Um desafio para contabilidade é gerar informações pertinentes para todos os interessados (stakeholders) na informação. Elaborar uma informação sob medida para cada interessado torna-se inviável sob o ponto de vista do custo benefício. Os custos de transação seriam elevados.
Acionistas e credores divergem nos seus interesses, por exemplo. Enquanto os acionistas visam o resultado da empresa, balizando-o com o resultado da gestão, os credores procuram informações voltadas à capacidade de pagamento, risco e outras modalidade relacionadas ao crédito. Dessa forma, a empresa poderá tender a formular suas informações voltadas ao agente com maior influência dentre os seus contratos.
A informação contábil constitui, portanto, um pilar importante para direcionamento das escolhas de políticas e procedimentos contábeis, em especial no mercado financeiro. O processo de reconhecimento e mensuração dos componentes contábeis revela a situação econômica de uma empresa através da emissão de demonstrativos contábeis padronizados e elaborados para fins de informação. A informação complementa-se com a divulgação dos métodos, técnicas e julgamentos empregados durante o reconhecimento e a mensuração. (Lopes & Martins, 2005).
Para o mercado, a evidenciação de todos os fatos impactantes nos números contábeis das empresas é imprescindível na redução dos custos do processo de negociação entre os agentes. (Watts & Zimmerman, 1990) e (Jensen & Meckling, 1976). Parte-se do pressuposto de um mercado onde as informações estejam disponíveis para todos, denotando uma eficiência de mercado.
Aklerlof (1970) pressupõe o uso de informações privilegiadas por apenas uma dessas partes, cuja redução depende do desprendimento dessas informações intrínsecas através de aumento de seu disclosure. Healy e Palepu (2001) acrescentam o desafio crítico de uma alocação ótima de investimentos para qualquer economia face às subjetividades implícitas nas informações divulgadas. Hunton, Libby e Mazza (2006) indicam a crença dos gestores no aspecto positivo de tornar as divulgações menos transparentes, reforçados na premissa de uma menor intensidade de reação dos mercados à informação desconhecida e na alegação de haver sanções a empresas transparentes.
Portanto, a otimização do mercado de capitais depende da real intenção de manter os usuários da informação contábil cientes de todos os fatos incidentes sobre sua decisão de investimento. Essa atitude é dificultada por questões culturais e legais tais como o ordenamento jurídico de um país. No Brasil, país code law, há a tradição da decisão/escolha contábil pela regra e, possivelmente pela divulgação daquilo dito como obrigatório.
Problemas de assimetria ocorridos após o contrato ser firmado trata-se do risco moral. Para Macho-Stadler e Pérez-Castrillo (2001) o risco moral decorre do fato de o principal não ser capaz de acompanhar o comportamento do agente após o acerto contratual.
Questões relacionadas ao esforço despendido para realização do contrato é o cerne da resolução do contrato a ser firmado. Se por um lado o agente pode se beneficiar da falta de monitoramento, do outro o principal, cônscio dessa possibilidade pode precificar o risco moral e reduzir a remuneração contratada ou propor incentivos para alinhamento dos interesses de ambos (principal e agente).
Ainda assim, permanecem problemas quanto ao equilíbrio contratual. A dificuldade de saber a ação do agente pode levar o principal a sempre precificar esse risco e remunerar agentes com incentivos desnecessários. Dessa forma, é preciso diferenciar cada agente e reconhecer os reais riscos existentes na relação.
Comparativamente à seleção adversa, o risco moral diferencia-se por representar ações não divulgadas, enquanto a primeira baseia-se em informações não divulgadas. Assim, ambos carecem do real interesse do agente na concretização de redução de assimetria.
Sob o ponto de vista contábil, é possível atuar mensurando confiavelmente a remuneração baseada em desempenhos. Pressupõe-se a acurácia do resultado divulgado e a confiança na metodologia utilizada para seu cálculo. Com base nos resultados obtidos verifica-se o reflexo do interesse do principal. Ainda assim, a remuneração do agente pode conter valoração baseadas em riscos inexistentes.
Verrechia (2001) estabelece três categorias de disclosure que direcionam as pesquisas nessa área: a) divulgação baseada em associação; b) divulgação baseada em julgamento; e, c) Divulgação baseada em eficiência.
A divulgação baseada em associação interessa aquelas pesquisas com intuito de associar a divulgação com outras variáveis. O custo de capital, preço das ações, rentabilidade são exemplos de variáveis retratadas em pesquisa dessa natureza com associação ao disclosure. As pesquisas baseadas em associação pressupõem a informação ser diferente entre os participantes do mercado e estes a interpretarem de forma diferente. (Salotti & Yamamoto, 2005)
A análise do processo endógeno da firma quanto a divulgação remete ao disclosure baseado em julgamento. Trata-se do processo onde pesquisadores avaliam a divulgação discricionária de informações pelos gestores. Consideram-se os incentivos dos gestores para divulgar determinada informação. Os interesses são diversos: sinalização de notícias boas ou más, demonstração de informações que a diferencie das demais, dentre outras. (Salotti & Yamamoto, 2005)
A divulgação com base no julgamento normalmente desencadeia um interesse especial, qual seja o desempenho. Assim, a terceira categoria proposta por Verrechia (2001) consiste na divulgação baseada em eficiência para a qual as informações serão divulgadas pelos gestores por entenderem gerarem melhor eficiência nos seus resultados.
Por fim, o processo de divulgação não se desvincula da discricionariedade da gestão. As informações são divulgadas para atender especificações legais, mas também para satisfazer o interesse da gestão. Diversas pesquisas são realizadas no sentido de verificar níveis de disclosure, cujos resultados não convergem para o mesmo ponto. Seja pela metodologia aplicada ou pela dificuldade de se mensurar o nível de divulgação, há que se considerar a possibilidade de, mesmo com exigências legais, a gestão pode preterir algumas divulgações em favor de outras.
Akerlof, G. A. (1970). The Market for “Lemons”: Quality Uncertainty and the Market Mechanism. The Quarterly Journal of Economics, 84(3), 488-500.
Hunton, J. E., Libby, R. & Mazza, C. L. (2006). Financial reporting transparency and earnings management. The Accounting Review, 81(1), 135-157.
Healy, P. M. & Palepu, K. G. (2001). Information asymmetry, corporate disclosure, and the capital markets: A review of the empirical disclosure literature. Journal of Accounting and Economics, 31(1-3), 405-440.
Jensen, M. C. & Meckling, W. H. (1976). Theory of the firm: Managerial behavior, agency costs and ownership structure. Journal of Financial Economics, 3(4), 305-360.
Lopes, A. B. & Martins, E. (2005). Teoria da contabilidade: uma nova abordagem. São Paulo: Atlas.
Macho-Stadler, I. & Pérez-Castrillo, J. D. (2001). An introduction to the economics of information. (2\(^{a}\) ed). Oxford: Oxford Unviersity Press.
Paulo E. (2007). Manipulação das informações contábeis: uma análise teórica e empírica sobre os modelos operacionais de detecção de gerenciamento de resultados. Tese de Doutorado, Universidade de São Paulo, SP, Brasil.
Salotti, B. M. & Yamamoto, M. M. (2005). Ensaio Sobre a Teoria da Divulgação. Brazilian Business Review, 2(1), 53-70.
Verrechia. R. E. (1990). Information quality and discretionary disclosure. Journal of Accounting and Economics, 12(4), 365-380.
Watts, R. L. & Zimmerman, J. L. (1990). Positive accounting theory: a ten year perspective. The Accounting Review, 65(1), 131-156.
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